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Chapter 6 - Capítulo 5: Vontade Inquebrável

## **Capítulo 5 – Vontade Inquebrável**

A noite avançava silenciosa, quebrada apenas pelo som abafado da chuva contra o vidro. O quarto de Azazel estava mergulhado na penumbra, iluminado apenas pela luz trêmula da lareira. Sentado na beirada da cama, com o olhar fixo no chão, ele parecia distante, como se existisse em outra realidade — uma realidade onde não havia dor, nem limite, nem doença.

Mas a realidade era outra.

Ele sentia. O corpo queimava por dentro como se algo o devorasse lentamente. Seu sangue era denso, pesado. A doença que o médico Marc diagnosticara cinco anos atrás havia se tornado mais silenciosa, mas também mais mortal. Não havia cura. Apenas promessas vazias e esperança mascarada por sorrisos frágeis de adultos tentando esconder a verdade de uma criança que já sabia demais.

Desde que Marc começara os testes e rituais para entender sua condição, Azazel se mantinha alerta. Observava tudo. Estudava. Absorvia o conhecimento como quem devora carne. Ele não era uma criança comum, e todos que se aproximavam percebiam isso. Sua mente era afiada como uma lâmina, e seu silêncio carregava mais peso do que qualquer discurso.

"Você está acordado."

A voz familiar de Lizzie atravessou a porta entreaberta. Ela entrou com passos calmos, embora o rosto estivesse visivelmente cansado.

"Sim."

A resposta foi curta, como sempre. Lizzie se aproximou e sentou-se ao lado dele. Tocou de leve seu ombro, mas ele não se moveu. Não por rejeição, mas por contenção. Ele odiava vê-la sofrendo. O silêncio entre os dois durou minutos, mas era confortável. Ambos entendiam que, naquele momento, o simples fato de estarem juntos bastava.

"Marc quer conversar com você amanhã. Ele disse que descobriu algo importante."

Azazel não reagiu. Apenas murmurou:

"Não há cura. Ele só quer tempo."

"Ele está tentando ajudar. Eu acredito nele."

"Eu também acreditaria, se o mundo fosse justo."

Lizzie suspirou. Ela sabia que não podia convencê-lo do contrário. Azazel havia amadurecido demais para sua idade. Ele via tudo. Sentia tudo. E compreendia o mundo de uma maneira brutalmente lúcida.

"Você é forte, Azazel. Mais do que qualquer um que eu já conheci."

"Não quero ser forte, mãe. Eu só quero viver."

Ela não respondeu. Apenas o abraçou. E, por um breve momento, ele permitiu.

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Na manhã seguinte, Azazel caminhou até o salão reservado para rituais médicos. O local era escuro, forrado com runas e inscrições mágicas em línguas antigas. Marc o esperava de pé, encostado em uma mesa de madeira coberta com frascos, pergaminhos e artefatos mágicos.

"Bom dia, Azazel. Agradeço por vir sozinho. Isso facilita o que precisamos discutir."

"O que descobriu?"

Marc sorriu, surpreso pela frieza da pergunta.

"Você é direto. Muito bem. Eu revisei seus fluxos vitais, e comparei com registros de doenças extintas, maldições do sangue e até mesmo mutações geradas por magia antiga."

"Vá direto ao ponto."

Marc respirou fundo. Ele estava diante de um ser diferente. Já sabia disso há tempos, mas agora, tinha certeza.

"Você tem uma anomalia em seu sangue. Uma ruptura genética causada por forças externas. Não é natural. Essa doença foi... construída. Criada."

Azazel permaneceu em silêncio. Mas internamente, a raiva crescia.

"Então alguém me amaldiçoou?"

"Não sei se amaldiçoou ou experimentou. Mas o que sei é que sua energia vital, ao invés de se consumir com a doença, tenta reagir. Sua mente, corpo e sangue estão se adaptando. Você está evoluindo para sobreviver."

"Em que sentido?"

"Você está se tornando uma criatura que não deveria existir. Uma fusão de humano com algo... monstruoso. Mas essa transformação precisa de um gatilho para avançar. Um estímulo extremo."

Azazel compreendia. A doença não era apenas uma sentença de morte — era um desafio. Um campo de testes. E ele estava reagindo da única forma possível: com poder.

"Então preciso morrer... para viver."

"Não exatamente. Mas chegar à beira da morte pode ser a única forma de ativar sua verdadeira natureza."

Azazel saiu da sala sem dizer mais nada. Cada passo era acompanhado por um pensamento nítido: ele não seria vítima. Seria o predador. Mesmo que o mundo inteiro tivesse que ser consumido para isso.

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À noite, Noah o observava de longe. Silencioso. Distante. Os olhos daquele garoto não pertenciam a uma criança — eram os olhos de alguém que já havia aceitado a dor como companheira.

Lizzie apareceu ao lado de Noah, tentando esconder a apreensão.

"Ele está mudando."

"Sim. Mas isso não significa que sobreviverá."

"Você ainda quer mandá-lo ao Norte, não é?"

"Ele vai morrer aqui. No Norte, ao menos, pode cair lutando. Ou talvez..."

"Ou talvez sobreviva."

"Talvez."

Noah se retirou. Lizzie permaneceu olhando para o horizonte, sem saber que naquela mesma noite, Azazel tomaria a primeira decisão definitiva de sua vida.

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Em seu quarto, Azazel desenhou no chão um círculo mágico de sangue. Estava fraco. As dores voltavam com mais frequência. Mas sua mente estava firme.

"Eu nasci doente. Mas não vou morrer fraco."

Ele apertou a palma da mão até o sangue escorrer e alimentou o círculo. Sua energia pulsou como nunca antes. Um brilho vermelho intenso envolveu o cômodo.

"Se meu corpo precisa sofrer para evoluir, então que sofra. Mas eu não vou recuar."

Era o início da transformação. Não física, ainda. Mas espiritual. Azazel estava pronto para caminhar rumo ao inferno — e dominá-lo.

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